Meu maior receio quando escrevo é o de produzir um texto cheio de clichês cafonas. Eu não tenho nada contra clichês, tenho até amigos que usam, mas pra mim o clichê é como piada machista/racista/homofóbica/classista: um humor que não é humor, sem qualidade, que tira proveito de privilégio e ignorância. Humor inteligente mesmo é fazer o público rir de macho branco hétero rico.
Me perdoem, estou desviando do assunto.
Então, os clichês. Eu só pensava em clichês enquanto caminhava os 21 quilômetros da trilha Alton Circular. Pensava como o céu estava azul ‘sem filtro’, e a temperatura perfeita usar um fleece e não começar a suar imediatamente no início da caminhada. Pensava como as cores das flores - narcisos, quantos narcisos! - estavam destacadas em meio ao verde, e como o som dos pássaros - principalmente os faisões - estava mais alto. Como as texturas pareciam mais salientes. Como o cheiro do wild garlic mais potente.
Ou talvez eu que estava prestando mais atenção.
Eu sabia, é claro, que estava com saudades de uma trilha - não apenas o caminhar, mas também os momentos, como ‘cenas’ de um filme, que fazem a trilha mais do que simplesmente ir de um ponto a outro (ou de um ponto a exatamente o mesmo ponto, no caso da trilha circular!): atravessar portões para passar de um campo para um bosque, passar perto de vacas e carneiros, enterrar o pé em lama, cumprimentar outros hikers e também os locais passeando seus cachorros que a gente cruza pelo caminho, encontrar o lugar ideal pra parada do almoço.
Mas o que me surpreendeu foi perceber que estar de volta fazendo tudo isso foi tão fácil, tão ‘faço isso todo dia, já é parte de mim.’ Muito mais parte de mim do que sair da cama e ir trabalhar, o que de fato eu faço todo dia.
Alton circular
Foi legal acompanhar um pouco da sua trilha e fiquei com vontade de experimentar a sua maionese. Obrigada por compartilhar.